Todos nós somos culpados (ou “Nossa visão parcial da política: uma aproximação”)

Existem fenômenos muito interessantes ocorrendo no Brasil dos últimos meses (talvez anos). Parece que nunca foi tão grande o interesse por política (ou pela política partidária, o que me parece mais acertado para descrever o objeto de interesse) pelo cidadão comum, médio, brasileiro.
De alguma forma, o momento atual (de 2013 pra cá) fomentou nas pessoas um interesse apaixonado pelo tema. E como toda paixão, esse interesse é cego feito uma toupeira e a razão que ele demanda para refletir sobre as consequências e causas de cada ação embarcou para “Nowhere Hills” a muito tempo.
Durante os dois anos antes das eleições, os observadores mais atentos (ou nem não atentos assim) puderam perceber uma enxurrada – especialmente em cidades de agronegócios e nos maiores centros urbanos do Centro-Sul – de adesivos “Fora Dilma”. Uma marcação de posição que demonstra um fluxo de individualidades para um mesmo objetivo comum. Tal coisa é natural e esperada numa democracia. Nela não se espera unanimidades (e normalmente é bom que elas não ocorram, ou ocorram com pouca frequência). Durante o período eleitoral, o ânimo já acirrado fez as discussões sobre a disputa sair da intensidade de torcidas de times de bairro para a de torcidas num clássico nacional, com torcidas organizadas dispostas a matar e morrer por suas “cores”.
Agora tem-se visto algo que podemos classificar como a exacerbação da miopia institucional que atinge a maior parte das pessoas. Carros desfilam pelas congestionadas cidades brasileiras ostentando adesivos dizendo que “não é minha culpa, votei no Aécio”. Mantêm-se a migração da visão clubística para a política. Percebemos que ainda não está claro o funcionamento da democracia (quando espaço de discussão e reivindicação, não como instituição distante e impessoal) por nós.
O modelo de representação que temos hoje nos faz confundir o indivíduo com o governo. Não enquanto personalismo político (“A Dilma cortou o orçamento” ou “O Beto Richa mandou fazer uma obra” ao invés de “O governo federal cortou o orçamento” ou “O executivo do Paraná mandou fazer uma obra”), mas sim enquanto nível de indivíduo. Depois da eleição costumamos encarar a questão de modo que “se o meu candidato ganhou, ótimo! ele fará o que tem que ser feito, se foi outro candidato, não tem problema! Ele que se vire pra lá”. Tal percepção é bastante falha, pois o eleito passa a representar a unidade da federação à qual ele se liga. Ele pode ter seus grupos de apoio ou de oposição mais fortemente organizados, onde ele tem uma interlocução mais ou menos fácil.
Entretanto, a política de representação (mesmo falha e cheia de “pontos cegos”, como o modelo de voto proporcional, de mandado, dos financiamentos de campanha, da transparência de ações governamentais e da fidelidade partidário-ideológica) se mostra calcada no ponto central da Carta Magna: “O poder emana do povo”. E sendo aí baseada, o “povo” (essa entidade difusa que serve pra tudo, menos pra ele mesmo) deveria ser figura ativa no processo, pressionando e influenciando os “representantes” daquele estado, município, bairro.
Assim, poderíamos dizer que quem votou no Aécio tem culpa também no processo que vemos hoje, assim como quem votou na Dilma, na Marina, no Pastor, em branco etc, pois seus representantes – ou representantes de seu estado, ou de suas ideias (encaixe o qualificador que for mais adequado na sua escolha) – precisam ser pressionados para que defendam interesses maiores do que das individualidades que eles possuem.
Deixar os políticos “soltos”, sem pressão para que se vote, ou aprecie, as questões que se mostram importantes para o ordenamento dos poderes abre espaço para causuísmos, leniências e o afloramento de alianças inconvenientes (mas desejadas por eles, políticos). Mas não é dizendo “não tenho culpa” que construiremos um sistema mais eficaz e inteligente, dando verdadeira vida ao primeiro artigo da Constituição.
(espere novos textos… 😉 )

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