Explosion aboard the Yamato as she was sunk on 7 Apr 1945

Nuvens sobre o Cáucaso. Problemas para o mundo?

Em algum momento de 2008 (não tenho a data exata), fiz um texto que foi publicado na coluna de opinião do Jornal do Tocantins sobre o conflito entre a Rússia e a Geórgia. Como havia limitação de espaço, ele foi uma versão encurtada desse que divulgo hoje. Existem muitos pontos em 2008 que se mostram ainda mais significativas hoje, durante esse novo conflito, agora entre a Rússia e a Ucrânia. Procurei não modificar o texto, apenas corrigindo algumas falhas de português ou substituindo um ou outro termo (que deixei o original rasurado para vocês verem)

Estamos vendo novamente um conflito que deixa lideranças e população de todo o mundo apreensivas, ou pelo menos em estado de alerta. Porque deveriam? Nós, moradores do Brasil temos o que temer?

Antes de pensar sobre isso, é preciso buscar entender o quê de tão problemático está ocorrendo no Cáucaso.

Um panorama inicial

A inter-relação de interesses é maior do que podemos imaginar ao assistirmos os telejornais ou lermos os diários. Comecemos com a Rússia. Com o fim da URSS e do comunismo como sistema de governo lá, o papel de potência mundial foi tirado deles. Durante algum tempo, enquanto se sentia a “ressaca” do fim da Guerra Fria, a Rússia foi colocada lado-a-lado com países chamados “emergentes”: Brasil, Índia, China. Isso porque sua economia ainda não tinha a força de capitaniar arregimentar capitais mundialmente. Politicamente falando, a Rússia ainda tinha alguma expressão por causa da herança soviética: assento no Conselho de Segurança da ONU, um exército considerável, armas nucleares e uma vasta extensão territorial que lhe oferece alguma folga em relação a recursos naturais (como petróleo).

Mas a Rússia passou a buscar uma liderança dentro do cenário politico-militar mundial com a subida ao poder de Vladmir Putin, diga-se de passagem um ex-agente da KGB.

As ações russas no cenário mundial passaram de um “urso embriagado” para algo mais consistente. Deste modo, ressurge um grande jogador dentro do cenário mundial, aproveitando a herança que recebeu do período da Guerra Fria.

Entre a queda da URSS em 1990 e hoje muita coisa mudou no cenário mundial, e aí é que surgem elementos para dificultar a análise. A União Européia tomou um pouco do vácuo de liderança criado pela queda soviética. A UE deriva de um processo que já havia se iniciado antes de 1990, mas que, naquele tempo, ainda abrangia basicamente países do Oeste (apoiados por Washington). Durante as últimas décadas a UE consolidou-se como força politica e econômica, passando a crescer para leste, abrangendo, aos poucos, países que outrora estiveram sob a influência soviética. Como as lideranças do bloco, por vezes, divergiram sobre as ações dos EUA, chegando a condená-las (vide o exemplo último da invasão ao Iraque), o bloco como um todo se mostrou um aliado instável e independente diante da liderança americana.

Os EUA sempre tiveram uma política externa muito proativa e para escapar dessas dificuldades com a UE, passaram a agir em frentes diferentes. Buscaram consolidar-se como liderança mundial única, através de ações políticas, econômicas e militares. Assim trataram de costurar apoios em regiões periféricas significantes (por causa ou da mão-de-obra, ou da matéria-prima, ou do mercado, ou ainda por um misto das três coisas anteriores). Aproximaram-se de países do Leste Europeu, Ásia Central e do Sudeste Asiático. Apoiaram lideranças pró-ocidente nesses países. Ofereceram treinamento militar e cooperações técnicas. Propuseram a ampliação da OTAN (englobando países do leste) e tem desenvolvido propostas para a criação de um escudo anti-misseis em territórios ao redor da Rússia (mesmo alegando que o alvo seja “países criminosos” na visão dos EUA, como Irã e Coréia do Norte ou terroristas).

Mas não é só isso…

Ainda existe um outro lado nessa discussão:as ex-repúblicas soviéticas. Os povos que vivem ao redor do que hoje chamamos Rússia sempre tiveram um problema: a Rússia. Desde o tempo do Império Russo, nações que estavam nas fronteiras sofriam com o expansionismo eslavo (sim, os russos são eslavos, como os poloneses, ucranianos e sérvios, entre outros). Deste modo, muitos países tem curta história independente, principalmente nos períodos de crise do “Irmão do Norte”. Depois da queda do Czar e de revolução russa por exemplo alguns países tiveram governos autônomos. Mas com a ascensão de Stalin e o estabelecimento da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), muitos desses países foram invadidos e absorvidos. A URSS, como diz o nome, era uma união de vários países, teoricamente independentes entre si, mas totalmente sob o controle dos poderes centrais estabelecidos em Moscou. Com o fim da URSS, muitos dessas repúblicas viram a possibilidade de tornarem-se independentes. Surgem aí os diversos países, principalmente (mas não só) no sul e no noroeste da antiga União Soviética.

Esse é o caso da Geórgia, que além do expansionismo do período soviético ainda carrega outra marca desse período: a migração que foi efetuada nessa época, trazendo assim muitos russos para algumas regiões do país.

Esses grupos migrantes são maioria nas áreas principais do conflito que vemos hoje. Como não aceitam sua incorporação a um estado não-russo, passaram a entender-se como países independentes, mesmo sem reconhecimento de nenhum país (nem mesmo a Rússia, que os apóia) [essas regiões hoje recebem reconhecimento e apoio da Rússia].

Um olhar sobre a atualidade [no caso, de 2008, mas que serve pra 2022 também]

Dado esses panoramas históricos principais, chegamos a situação atual. Com o interesse russo de expansão e liderança, a proposta de ampliação da OTAN para abrigar países como a Geórgia e a Ucrânia causa um choque de interesses para a Rússia, já que essa compreende ser a OTAN um instrumento dos EUA contra si. Isso está associado também a instalação do escudo anti-misseis (uma releitura da administração Bush do conceito levado a público durante o governo Reagan no início da década de 1980), usando como base países como Polônia.

Além disso, a existência de grandes oleodutos que passam nessa região, sua proximidade com importantes rotas comerciais e com áreas de aliados importantes – como Irã – faz que o domínio dessa região seja um trampolim para as intenções russas.

Mas não são apenas essas as questões. A Rússia vê com maus olhos o reconhecimento imediato que foi dado ao Kosovo, quando esse declarou independência, pois a Sérvia é uma antiqüíssima aliada russa. O aumento de grupos pró-ocidente ao redor das fronteiras russas e a continua oposição que é feita as intenções russas de liderança faz com que os russos busquem grupos aliados para “igualar a balança”. As ameaças a Ucrânia em relação seu interesse em ingressar na OTAN, a oposição a política americana para o Irã e a própria invasão a Geórgia são mostras do incomodo que ronda os dirigentes do Kremilin e sua forma de lidar com isso.

Qual a preocupação do mundo agora? As discussões que são travadas na ONU nesse momento não são somente sobre questões humanitarias. O grande receio é que uma reação a essa operação russa possa desencadear uma guerra mais ampla. Isso por que as alianças estão muito intrincadas nessa região e qualquer passo criará um impasse diplomático muito sério.

A Rússia tomou a dianteira em ações militares pois viu uma motivação clara – a proteção de seus cidadãos, já que a maior parte dos georgianos [e em 2022 dos ucranianos] que vivem nas repúblicas separatistas tem passaporte russo – e agora pode fortalecer sua posição naquela região, impedindo a expansão da influência americana por lá. Os EUA e a OTAN tendem a não entrar em confronto direto, pois isso seria bastante improdutivo principalmente para Bush, por ele estar em período de eleições e ter que criar condições favoráveis para o candidato do seu partido.

A não ser que outros países da região, como Turquia ou Ucrânia, sejam atacados, esse é um conflito com uma expansibilidade restrita. Não quer dizer que não possa se ampliar. Caso a Rússia sinta-se com poder suficiente para impor seus interesses para os vizinho, alguns medos reaparecerão e certamente as respostas ocidentais serão mais incisivas.

Para o Brasil, os medos ainda não se sentem. Mas por causa de mexer com alguns elementos delicados (petróleo e hegemonia politica), essas questões podem estourar em nós caso um conflito seja mais prolongado ou seja expandido. Por momento, o risco maior é que banalizemos ainda mais a violência que se apresenta nos jornais, já que o petróleo usado aqui não é transportado por aquela região. Mas é bom acompanhar o desenrolar da questão. , já que é a argumentação usada lá pode reaparecer aqui ou mesmo devido uma expansão da questão.

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