Os 10 anos de 12 de setembro: por trás do Ground Zero.
Nos últimos dias, qualquer um que procurou quaisquer informações na mídia (escrita, falada ou televisiva) acabou se deparando com um fenômeno bastante curioso. As imagens que aterrorizaram muitos, fizeram a alegria de alguns e serviram como um tapa na cara daqueles que acreditavam incondicionalmente na capacidade de uma potência hegemônica manter seu poder diante de nações e povos sem contestação efetiva voltaram a tona, sendo veiculadas com sofreguidão igual ou maior do que na época em que ocorreram: os atentados às Torres Gêmeas, em Nova Iorque.
Surgem a todo instante, como num caleidoscópio, as cenas das chamas nos prédios e da nuvem de poeira levantada por sua queda, aproximadamente 102 minutos depois das primeiras explosões. À cavaleiro disso aparecem também as diversas abordagens para o que ficou do acontecimento: a questão dos familiares, o desespero daqueles que estavam nos aviões e nos prédios – tudo devidamente registrado em conversas telefônicas ou imagens amadoras de vídeo – as mudanças advindas do desafio ao poder bélico, econômico e politico "ocidental" (leia-se dos EUA e de parte da Europa) representado pelo ato assumido por um grupo que era desvinculado aos velhos e tradicionais inimigos: países "párias" dentro do sistema de direito internacional. Nesse caldeirão de informações, ganham novo fôlego, como uma fogueira que se enfraquece e recebe borrifadas de álcool, as teorias conspiratórias (bem ao gosto de grupos menos propensos a acreditar no que o poder estabelecido lhes informa [Nota: será que lhes cabe a alcunha de "radicais"?]), onde toda a verdade estaria 'lá dentro', nos arquivos e documentos reservados dos serviços secretos e especiais dos países interessados.
Essa última semana, culminando no "Dia de descanso cristão", houveram homenagens, lembretes, minutos de silêncio e consternação. Um grande ritual de recordação, procurando gravar na memória, de maneira ainda mais profunda do que o próprio acontecimento, aquilo que motivou e moveu numerosas iniciativas e empreendimentos, de todas as ordens da atividade humana.
Mas, hoje é segunda-feira. E depois desse movimento todo, como no Réveillon, se olha para frente, com promessas, esperanças, desejos e resoluções (que talvez, como as resoluções da ONU, sejam solenemente ignoradas 2 ou 3 dias depois). Mas alto lá! Se o dia 11 merece tanta atenção e reflexão, não podemos nos esquecer de outro dia muito importante: o dia 12 de setembro de 2001.
Pode parecer que o que digo seja só para polemizar. Mas efetivamente não é (ou seja, mas não aceito que seja só pra isso). O dia 12 é tão importante quanto o 11 de setembro. Isso por que, se esse é o "Dia da Infâmia" (e acabamos assim vinculando ele ao maior ato de guerra que os EUA tinham se deparado até então: Pearl Harbor), aquele é o "Dia da Reação". É o momento que o gigantesco Golias procura o seu Davi (a metáfora bíblica só serve quanto ao tamanho, já que poucos se colocavam – e se colocam – a favor do Davi/Al Quaeda). A máquina da revanche foi posta em marcha efetivamente naquele dia 12, quando ouvimos suas engrenagens rangerem e estralarem, movimentando uma massa descomunalmente grande. A lógica tradicional se fez presente, enquanto víamos o "mais forte" buscando esmagar "o mais fraco". E aquele foi um momento de grandiosa estranheza, no qual os opostos se aproximaram, e um vento de "união" e inacreditável "concórdia", verdadeiro 'Santo Graal' de políticos fracos desejosos de uma tranquilidade que muitas vezes inexiste no jogo político, soprou sobre as legiões políticas – particularmente dos EUA. Houveram depois oposições, a francesa (que trouxe para junto de si alemães e outros europeus), mas naquele primeiro instante todos se sentiram atacados, vendo na queda das Torres, a queda também de seus símbolos de força, liderança e poder.
Mas, e sempre há um mas, o que observamos nos dez anos depois dessa movimentação toda? Muita coisa mudou, e mudou dramaticamente. Os eixos de poder foram modificados, e os EUA passam por novas situações. Crises econômicas, ascensão de outros "global players", questionamentos ao modelo político vinculados aos ideais da Revolução Francesa. Presenciamos a Grande Potência e seus aliados se desentenderem, o inicio de uma guerra que mais pareceu agradar mais demandas internas estadunidenses do que americanas ou ocidentais. Presenciamos também o recrudescimento dos nacionalismos, com sua feição mais restritiva de liberdades.
Essas mudanças traduzem uma nova ordem mundial, distante da que vivenciamos e aprendemos a compreender durante a guerra fria e a bipolaridade politico-militar. E ainda não conseguimos apreender corretamente esse novo mundo. Acabamos presenciando a marcha daqueles que tentam manter as coisas como compreendem e, digamos assim, no "modelo antigo".
A velha diplomacia mantem suas falhas, a força das armas contra um inimigo difuso se mostra pouco eficaz. Os interesses locais acabam se sobressaindo aos interesses globais. Isso parece ser a luta de um velho paradigma que, sabendo-se em vias de extinção (ou ao menos de enfraquecimento acentuado), tenta se manter vivo.
O novo paradigma, pelo menos pelo que vemos, ainda não está claro. Mas já desenha no horizonte sua sombra. Não é o mundo tenebroso que alguns apontavam, com ditaduras eletrônicas ou terror generalizado, nem é o mar de rosas, felicidade e concórdia que muitos desenhavam poś-muro de Berlim e URSS.
Com os ataques de 11 de setembro, a máquina que passou a mover-se nesse fatídico 12 de setembro fazia crer que qualquer movimento não alinhado com os ideais dos EUA, suas crenças e seus desejos, corria o sério risco de estar nas mãos dos "facínoras assassinos terroristas islâmicos inimigos da liberdade". Seria então uma ótima forma de reunir em torno de si todos os que não queriam ser vistos como "nações párias". Mas essa classificação binária (bons e maus), não resistiu a apreciação mais cuidadosa (filosófica?) das intenções dos "defensores da liberdade".
Ontem, um analista expôs que a "Primavera Árabe" seria uma espécie de "11 de setembro as avessas". A "primavera" não se alinharia com os desejos dos grupos então dirigentes no EUA que usaram a guerra como uma base para tentar melhorar a (sua) economia, mas nem por isso se aproximam dos ideais da Al Quaeda de restauração(?) de uma dinâmica politico-social extremamente ligada a preceitos ortodoxos da religião. Surgiria então um novo paradigma, mas isso não está restrito a (alguns) países árabes. China conseguiu a fortalecer sua posição de força econômica, o BRIC são os novos "tigres", mas com a vantagem de já saberem alguns erros dos tigres originais [Nota: nada a ver com os "tigres" da história brasileira], A Comunidade Europeia passa por um novo terremoto que pode enfraquecer terrivelmente o elemento que mais unifica o bloco: a economia.
Assim, devemos lembrar do dia 12 como o dia que a grande máquina se pôs em marcha, criando um novo panorama, diferente daquele que motivou o dia anterior… e a maquina ainda esta em marcha, não mais com um ou dois "pilotos", mas com tantos quanto possamos vislumbrar no horizonte.
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